sábado, 23 de janeiro de 2010

Rei de Nova York

Assim que vemos o olhar distante e reflexivo de Frank White (Walken em uma atuação fantástica)ao sair da prisão por longos anos, temos a certeza de que aquele homen irá buscar com muita astúcia o posto que é seu, apagando traficantes e policiais que atraálharem seu caminho. Já nos primeiros planos-sequência que Ferrara faz quando White sai da prisão, temos a absoluta certeza de que King of New York fará das imagens, da Trilha Sonora,bem como também das expressões faciais de seu protagonista não apenas uma diretriz por onde caminhar o filme. Vendo todas os mínimos detalhes dessa obra-prima de Abel Ferrara, temos certeza que aquela luz azul neon que pontua o filme desde quando White sai da carceiragem, ou aquele encerramento de plano com o fechar das portas do presídio, tudo, absolutamente tudo feito por Ferrara, nos encaminha de maneira contemplativa para aquele mundo degradado, violento, real,fantasioso, sujo e fascinante.

Todas as inumeras facetas compostas para cada situação, seguem a ordem natural da trama, nada é vão. Nem mesmo quando Jimmy Jump (Laurence Fishburne namelhor atuação de sua vida) ri dquele que acabara de meter-lhe um punhado de balas, nada disso soa falso diante do magnífico universo que Ferrara veio criar. Universo magnífico, mas não menos que real, seja pela coragem quase niilista de Frank White, seja por ele está sempre frequentando os mesmos lugares de pessoas da alta cúpula da cidade.

O filme por si só já é um evento de extrema grandeza. Seja pelos cuidadosos e precisos planos de Ferrara, seja por seu roteiro quadradinho e eficaz no que remete a direcionar a trajetória de White, seja na metáfora da cor azul, que quase sempre mostra as ruas de Nova York, degradantes e entupidas de viciados de todos os tipos. Não obstante, temos Christopher Walken em uma atuação quase mítica de um personagem fantástico, daqueles raramente vistos. Se em os viciosos o grande destaque dos diálogos foi a forma contundende ao mesmo tempo que ousada de como conceitos filosóficos/existencialistas eram discutidos, aqui, o escarnio de Ferrara é direcionado a hipocrisia social, mas não apenas ela. Impossível não ver em Frank White uma discussão muito mais que profundo sobre coragem, honra e, acima de tudo sinceridade.

Se não bastasse tudo isso, Ferrara mostra-se um puta diretor de cenas no mínimo fodas, explorando ao máximo o poder de suas imagens. A cena do tiroteio em Chinatown, o começo, o final, a cena em azul que é seguida por uma perseguição na chuva absurdamente bem filmada. O filme não perde o fôlego nunca, ao mesmo tempo que nunca soa descompassado.

Ao final dessa obra-prima absoluta e que seria o ponto de partida na melhor década de filmes de Ferrara, a situação de estar de frente de algo imortal quanto a sua capacidade de criar símbolos, é fascinante.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Amantes Constantes

Les Amants Réguliers, 2005 - Direção: Philippe Garrel - Elenco: Louis Garrel, Clotilde Hesme, Julien Lucas.

É interessante como Amantes Constantes consegue ser um filme tão grandioso, e ao mesmo tempo não embasbacar-se em gritar a todos os cantos o feito que executa. Sim, podemos considerar o filme de Garrel - e também ele próprio - como legítimo herdeiro daquele cinema praticado pela Nouvelle Vague em seus tempos áureos, mais ainda, a um trato extremamente peculiar na forma como Garrel se transmite principalmente os dramas psicológicos e sociais de seus personagens. Sobre quase todos os sentidos, o filme é feito do diretor para si mesmo, ou do diretor para aqueles que com saudosismo vêem cada dia mais o espírito do cinema genuinamente de arte praticado na França se perder. Em definição, são memórias recontadas de forma intimista e até desolada, onde a ficção serve para dar um fim trágico a uma paixão que surge no momento onde as esperanças políticas se esvaiam.

O filme começa momentos antes do Maio de 68 na França, onde o jovem poeta François (Louis Garrel interpreta se pai, Philippe) foge do alistamento militar. Em seguida, somos jogados direto nas barricadas estudantis, já em Maio. Após tais eventos, na casa de Antoine - sujeito rico e excêntrico que abriga alguns colegas revolucionários -, primo de François, em meio a festas e muito haxixe, François conhece Lilie (Clotilde Hesme não menos que divina), e os dois jovens apaixonam-se perdidamente e fazem juras de amor eterno.

De uma maneira precisa, sem soar pretencioso, Philippe Garrel reflete sobre a paixão em meio aquele caos, depois daquele caos, onde certo sentido de paranóia apossou-se daqueles jovens que haviam participado das barricadas. Teria alguma chance de Lilie conviver com François, sendo o jovem e talvez ela mesma procurados pela polícia após o Maio? Seria a ocasião o motivo que fez com que a bela moça de olhar apaixonado deixa-se seu poeta e fosse para os Estados Unidos atrás de seu "mecenas" que poderia lhe oferecer uma bela carreira como escultora? Garrel nos transmite através de imagens, apenas isso, em poucas palavras vemos o quão estavam apaixonados Lilie e François. Olhares, estes, muito mais de beijos - até onde eu lembre, um dos poucos beijos entre Lilie e François foi quando a moça estava despedindo-se do rapaz - mostram a paixão que brota de uma forma avassaladora.

Aos diálogos cabe a reflexão política, sobretudo. Há um momento em que um dos jovens, em plena tentativa de Revolução diz: “Será que podemos realizar a revolução do proletariado, apesar do proletariado?” Não há confusão maior, poucas palavras seriam capazes de expressar o sentimento de desolação daqueles jovens que viam seus esforços quase que serem em vão - no nível do presente em que os eventos ocorriam.

Um dos grandes destaques do filme, sem dúvidas, é a belíssima Fotografia em preto-e-branco, vencedora do prêmio especial de Veneza, que através de uma iluminação das mais eficientes dá ao filme uma particularidade que é só seu, sobretudo no começo do longa.

De uma sinceridade dramática absurda, que não cai em modismos estilísticos e/ou intelectuais, Amantes Constantes, certamente figura como um belíssimo retrato ficcionalizado por alguém que sentiu de perto uma época. Mais que isso, é um exercício puro de cinema, que se comunica de maneira bem particular - a forma como filma o cotidiano daqueles jovens, suas conversas, me lembra um pouco o estilo de Jarmush -, de forma que cada longo-plano do filme parece uma confidencia que o diretor só poderia expressar através da película, não haveria palavras.


quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Um chato marco do Cinema-Novo

Terra em Transe (1967) - Direção: Glauber Rocha

Terra em Transe é um filme honesto, sincero e dirigido por uma mente brilhante, capaz, corajosa. Glauber com menos de 25 fizera Deus e o Diabo na Terra do sol - o que eleva minha inveja e me faz perceber que sou quase nada pro mundo -, ao empreender Terra em Transe, o objetivo era tecer uma crítica em forma de um cinema ao mesmo tempo real e poético.

Com traços de Gravas e um pouco de Godard, Terra em Transe acaba por se tornar um filme excessivamente falastrão e, por vezes, inconsistente, devido ao imenso número de saltos do roteiro. Elipses confusas, aliadas a uma poesia visual que não sabe se envereda o caminho da crítica política, ou se firma na mente do jornalista Paulo, leam o filme a um desfecho no mínimo insatisfatório, pra não dizer enfadonho. Um fala não fala desnecessário e pedante gritado aos berros pela trupe de eficientes atores comandados por Glauber Rocha: Paulo Autran, Jardel Filho, José Lewgoy.

Acaba que o filme não conduz bem sua mensagem, ou conduz exageradamente, excessivamente, de forma atabalhoada. O resultado é que enquanto cinema, Terra em Transe fica mais como um planfeto reácionário sem propósito definido, que apenas fazer barulho. E olha que talento nunca faltou para Glauber Rocha.

Um excelente trabalho dos Coen


Fargo (1996) - Direção: Joel Coen

Na filmografia dos Coen, certamente não há espaço para grandiloquências estilisticas, ao contrário, o cinema praticado pela dupla reside justamente em relatar situações caóticas a partir de eventos e pessoas simples. Nesse sentido, tudo sai de controle em boa parte dos filmes dos Coen.

No começo de Fargo, surge um aviso nos dizendo que os eventos narrados no filme de fato ocorreram, e que foi alterado os nomes das pessoas em memórias dos mortos. A história inicia com Jerry Lundegaard (o eficiente William H. Macy), gerente de uma revendedora de automóveis que forja o sequestro de sua própia esposa, com o objetivo de conseguir um bom resgate a ser pago pelo pai de sua esposa. Combina com dois bandidos que ganhariam um parte do resgate.

Jerry, é um desses sujeitos bobões ao extremo, daqueles que tudo da errado, influênciáveis. Planejava enganar até os bandidos, já que dizia que o resgate seria 80 mil dólares, enquanto ao pai da moça disse ser de 1 milhão. Acaba que tudo passa a dar errado, tudo mesmo. Mas isso, esses problemas seriam o âncora - tal como Hitchcock dizia - da trama maior a acontecer. Nesse interim, os bandidos, em especial um, Gaear Grimsrud (grande atuação de Peter Stormare), matam três pessoas que "atrapalharam" o caminhar do sequestro. Enquanto a coisa vai ficando preta, surge a figura chave da trama, a policial grávida de 7 meses Marge Gunderson, (Frances McDormand - que ganhou o Oscar por sua atuação) que consegue perceber a dimensão que aquilo tomara.

De um argumento simples, surge um perrengue dos mais nonsenses possíveis, tudo caminha para o caos. O caos está em tela, diante daquele gélido Meio-Oeste estadunidense. Na direção sobra serenidade e parcimônia. É inegável o controle, sobretudo na forma como os eventos acontecem, como as coisas ganham um sentido verídico na mão dos Coen. Também vale destacar a eficiente dos irmãos na direção de atores. Com elencos bem escolhidos, as atuações sempre se sobresaem em seus filmes de maneira que o personagem ganha vida sobre o ator.

Uma Trilha Sonora bem captada, que aliada a gélida fotografia em tons claros realça o sentido de mistério que vai surgir daquele evento inicial. Ainda que não chega na amplitude de "Onde os Fracos não tem vez", "Fargo" é talvez até mais sincero quando vemos os demais filmes dos Coen, isso se colocarmos estes em um determinado "estilo".

sábado, 9 de janeiro de 2010

Hitchcockiando com De Palma

Dressed to Kill(1980), Direção: Brian De Palma

Instigante. Tenso. Cinematograficamente bem trabalhado, tais adjetivos sempre marcaram a longa lista de filmes de De Palma. Ao cineasta, também, foi imputado o tírulo de "herdeiro de Hitchcock". Mesmo assim, diante de referências explícitas aos trabalhos do "Mestre do suspense", De Palma ainda revela-se um diretor dos mais brilhantes, sobretudo, pela sólida carreira que construiu.

Dressed to Kill (Vestida para Matar) é um de seus melhores trabalhos, um dos que De Palma escancara ao máximo a influência de Hitch em seu modo de fazer cinema. Entretanto, a proeza de Dressed to Kill é a de maximizar grandes trunfos de filmes como Psycho, 1960 e Vertigo, 1958. O processo se dá não apenas através da narratividade semelhante - nesse caso a um simbiose perfeita dos filmes de Hitchcock -, mas também, cenas - a cena do museu de Vertigo, a do chuveiro de Psycho -, trilha Sonora - um excelente trabalho de Pino Donaggio, detalhes de câmera - Hitchcock tinha especial atenção em dar closes em detalhes importantes, que indicariam o futuro da cena -, bem como também, a utilização (perfeita nesse caso) do Split screen, além das loiras geladas e da bipolaridade (lembrem-se de Psycho).

A história fala de um terapeuta, Dr. Robert Elliott, que se vê em um difícil momento quando um psicopata mata uma de suas pacientes uzando uma navalha de seu consultório. Encaminhando-se nessa trajetória e despejando referências a Hitchcock, De Palma construira uma intricada trama, com muita sensualidade e mistério, sempre com uma invejável perícia técnica. O roteiro intricado, faz de cada personagem um mistério a ser revelado em tela. A trilha sonora acompanha com participação efetiva nos acontecimentos que ocorrem, sendo parte fundamental para que possamos sentir a intensidade das cenas. Interessante, é que no meio disso tudo, o diretor ainda encontre tempo para através do belíssimo trabalho de Fotografia, filmar uma Nova York em fim de tarde divinamente.

Com atuações interessantes, vemos a sempre bela Angie Dickson ( Kate Miller), - de Rio Bravo, onde ela está ainda mais bela e soberba - em uma atuação eficiente e despojada, mostrando sexualidade e talento ao transmitir com maestria o tipo de personagem necessário ao filme. Michael Caine, mostra-se dinâmico em um papel mutável, como é o Dr. Elliot. Além desses, cabe ressaltar a bela e sensual Nancy Allen, precisa desde o momento em que aparece no filme.

Muito além do que mera referência, De Palma é um diretor de estilo própio, que tem talento em criar cenas de suspense herculíneamente assustadoras. Dressed to Kill, nesse sentido, destava-se como uma obra a ser admirada em seus mais instigantes detalhes.


quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

O teatro da vida sendo visto de perto

Closer - Direção : Mike Nichols

Nichols parece que fez de seu filme um marco, que mesmo suscetível a uma enormidade de erros - principalmente de execução - conseguira conquistar com toda a sinceridade possível, o gosto de público e crítica.

São histórias atípicas, sim, nem por isso mesmo, menos humanas. Todos aqueles personagens amam a sua maneira. E, mesmo que Nichols tenha errado em os mostrar por vezes semelhantes em suas atitudes, é fato que cada faceta de seus personagens são mais que reais.

O grande destaque, fica mesmo por conta das atuações, sobretudo a da jovem Natalie Portman. Um Clive Owen sempre fraco, faz sua melhor atuação, o que não é muita coisa, mas que serviu para uma indicação ao Oscar. Jude Law, que é o personagem mais complexo da trama, tem uma excelente atuação, quando efetivamente exigido. Julia Roberts, merece esses tipos de filme, de bons diálogos, e que explorem melhor a boa atriz que o é.

Destaca-te também a cativante Trilha Sonora, linda e bem pontuada - até a Bossa Nova que ouvimos se ajusta perfeitamente ao contexto em que aparece.

Sobre o personagem de Law, o escritor Dan, vale dizer que ele, o mais sincero, foi, justamente, aquele que no meu entender final, se deu pior, amargurou as maiores dores. Mas real, impossível.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Filme-game de Cameron imita estruturas básicas de filmes do gênero amparando-se nos piores clichês possíveis

Avatar (2009) - Direção: James Cameron

Fica difícil até mensurar o tamanho da decepção que esse filme me causou. É uma bomba, de fato. Um filme pode ser prioritariamente imagens e sons. Desde que os mesmos, ou sejam acompanhados de diálogos eficientes, ou de um silêncio que faça das imagens "poesia visual". Cameron sabota tudo isso. O filme tem um roteiro pífio, com uma direção oportunista.

Seja na premissa idiota, a semelhança quase plagiária com Senhor dos Anéis, Star Wars, Dança com Lobos, Matrix, Titanic, Alien; seja na pirotecnia descerebrada onde os fatos conduzem a uma imensa pancadaria, só resta dizer que o filme é uma tremenda barbeiragem amparada em marketing, algo que apenas regride o cinema enquanto forma de arte.